quinta-feira, 2 de junho de 2011

O Homem e as Coisas

As coisas não se submetem
à nossa vestidura;
na máscara que somos
as coisas nos conjuram.

Por que não escutá-las,
tão sáfaras e puras,
como flores ou larvas,
estranhas criaturas?

Por que desprezá-las
no sopro que as transmuda
com os olhos de favas,
fechados na espessura?

Por que não escutá-las
na linguagem mais dura,
comprimidas as asas
na testa que as vincula?

Despimos a armadura
e a viseira diurna;
a linguagem resvala
onde as coisas se apuram.

Recônditas e escravas
na cava da palavra,
são fiandeiras escuras
ou áspides sequiosas.

As coisas não se submetem
à nossa vestidura.

Carlos Nejar

sexta-feira, 27 de maio de 2011


“Para os índios, diz-se, os soldados de Pizarro ou de Hernán Cortés eram também centauros. Um caindo da montaria, os índios viram dividir-se em duas partes o que tinham por um só animal e ficaram aterrorizados... Não tivesse tal fato acontecido, pensa-se, teriam matado todos os cristãos”.
Jorge Luis Borges

"Só o cavalo pode  chorar pelo homem. Daí por que, no centauro, misturam-se a natureza do homem e a do cavalo".
Bestiário - Século XII

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010









Tempo só (Time will tell)

(Por Gilberto Gil)

JAH would never give power to a baldhead
Run come crucify the dread
Time alone, oh! Time will tell
You think you're in heaven, but you're living in hell (3x)
Time alone, oh! Time will tell
You think you're in heaven, but you're living in hell


Back them up, oh not the brothers
But the ones, who set them up


Time alone, oh! Time will tell
You think you're in heaven, but you're living in hell (3x)
Time alone, oh! Time will tell
You think you're in heaven, but you're living in hell


Oh children weep no more
Oh my sycamore tree, saw the freedom tree
Saw you settle the score
Oh children weep no more
Weep no more, children weep no more

JAH jamais permitirá que as mãos do terror
Venham sufocar o amor
Somente o tempo, o tempo só
Dirá se irei luz ou permanecerei pó
Se encontrarei Deus ou permanecerei só
Se ainda hei de abraçar minha vó
Somente o tempo, o tempo só


Time alone, oh! Time will tell
Somente o tempo, o tempo só
Time alone, oh! Time will tell

You think you're in heaven, but you're living in hell

Bob Marley

quinta-feira, 16 de setembro de 2010


Não me prendo a nada que me defina. Sou companhia, mas posso ser solidão; tranquilidade e inconstância; pedra e coração. Sou abraços, sorrisos, ânimo, bom humor, sarcasmo, preguiça e sono. Música alta e silêncio. Serei o que você quiser, mas só quando eu quiser. Não me limito, não sou cruel comigo! Serei sempre apego pelo que vale a pena e desapego pelo que não quer valer... Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato. Ou toca, ou não toca.

Clarice Lispector

quinta-feira, 26 de agosto de 2010



Além Alma

Meu coração lá de longe faz sinal que quer voltar
Já no peito trago em bronze não tem vaga nem lugar
Pra que me serve um negócio que não cessa de bater
Mas me parece um relogio que acaba de enlouquecer
Pra que que eu quero quem chora se eu estou tão bem assim
E o vazio que vai lá fora, cai macio dentro de mim

Arnaldo Antunes

quarta-feira, 30 de junho de 2010


Pedra de Apoio

Eu ficaria melhor lá trás na época quando
Eu disse que nunca mais queria te ver de novo
Porque você estava amando, sim
Você estava amando outra pessoa
E eu sabia, oh sim, eu sabia
que eu não conseguiria me controlar.
E agora eles te trazem de volta
pra minha vida de novo então eu faço uma cara
Igual a dos seus amigos
Mas eu acho que você sabe
oh sim, você sabe o que se passa.
Porquê os sentimentos
oh sim, dentro de mim queimam forte.

Você ainda me liga de tempos em tempos
E seria tão difícil pra mim não passar do limite.
As palavras de amor beiram meus lábios
Como uma maldição.

E eu sabia, oh sim eu sabia
Que isso só iria piorar as coisas
E agora você tem a coragem
De entrar no jogo assim como
As batidas mistro na sua canção
Você se diverte, se diverte brincando comigo
E quanto menos você dá, mais
Eu quero tão tolamente

Não, eu jamais serei sua pedra de apoio
Aceite tudo ou me deixe em paz.
Eu nunca serei sua pedra de apoio
Eu estou de pé ereta
Sozinha.

Duffy

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Poema

Minha memória é um rio caudaloso
Onde, às vezes, eu me vejo submersa,
Afogada, asfixiada.
É um rio de torrentes que me arrasta
E me joga de um lado para outro,
Contra rostos, mãos, casas, esperanças,
Idéias, planos, ruas, despedidas,
Montes, mares, angústias e caminhos,
Pernas, pés, praias, solidão...
Estendo as mãos, as margens longe...
E vou me debatendo
Até que a voz do tempo
E o correr dos dias
Me salvem de mim mesma
E me coloquem outra vez
Nas margens tranqüilas do esquecer.

Regina Werneck

segunda-feira, 1 de março de 2010



JOGO DE MÁSCARAS

Finjo que imito o devir de um gato e seu simulado dever. Mas dissimulo ou, minto: só pretendo.

Caco Xavier

(clique sobre a imagem para visualizar melhor)

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010



(resposta)

Quando não tem outro jeito
porque sem jeito ficamos
o jeito é soltar o verbo
enquanto nos articulamos

um bom adjetivo também serve
pra desamargar o âmago
exercitar a verve
e tirar o nó do estômago

aquietar faz bem vez em quando
vez em quando bem quietos
melhor percebemos quando
vai desabar sobre nós o teto

mas deixar o mundo? deixá-lo...
ah, querida, não se pode
mesmo que quase tudo vá ao ralo
mesmo quando todo mundo nos f...

silencie sim mas não deixe
a vida passar tão quieta
feito no aquário aquele peixe
que quer o gato em sua dieta!


Valquiria G. Malagoli


Novamente

Me disse vai embora, eu não fui
Você não dá valor ao que possui
Enquanto sofre, o coração intui
Que ao mesmo tempo que machuca
O tempo, o tempo flui
E assim o sangue corre em cada veia
O vento brinca com os grãos de areia
Poetas cortejando a branca luz
E ao mesmo tempo que magoa o tempo me passeia
Quem sabe o que se dá em mim?
Quem sabe o que será de nós?
O tempo que antecipa o fim
Também desata os nós
Quem sabe soletrar adeus
Sem lágrimas, nenhuma dor
Os pássaros atrás do sol
As dunas de poeira
O céu de anil do pólo sul
Há dinamite no paiol
Não há limite no anormal
É que nem sempre o amor
É tão azul
A música preenche sua falta
Motivo dessa solidão sem fim
Se alinham pontos negros de nós dois
E arriscam uma fuga contra o tempo
O tempo salta

Fred Martins / Alexandre Lemos